terça-feira, 25 de abril de 2017

25 de Abril

Apesar de comemorarmos o aniversário no mesmo dia eu (infelizmente) sou muito mais velho do que a LIBERDADE. Contudo, ainda espero continuar a soprar as velas em conjunto durante mais uns bons anos e desejo, muito, que os meus continuem a comemorá-la para além de mim, e que nunca a percam.
Hoje, a minha irmã, para além de me encher de livros que quer que eu leia até ao Natal para voltar a reforçar o "armazém" - como se eu não tivesse mais nada para fazer - e de festejar comigo, ainda resolveu dar publicidade, nesse jornal de grande tiragem e elevado nível que é o Facebook, de poemas que, como me conhece bem, sabe serem de alguns dos meus poetas favoritos. 
Aqui ficam, na voz inconfundível de Manuel Alegre, as palavras de 4 poetas de quem eu gosto muito.

domingo, 23 de abril de 2017

Livros lidos (ou em vias disso)

Aprendi há muitos anos uma anedota que conta(va) a polémica desenvolvida por dois amigos de infância os quais, após o percurso escolar conjunto desde a primária até ao liceu, se separam na universidade, indo um para veterinária e outro para medicina. Amigos continuaram mas passaram a polemizar sobre a utilidade, eficiência e dificuldade das duas especialidades. O médico veterinário argumentava sempre com a grande dificuldade de curar os animais sem poder ouvir qualquer queixa ou sintoma; muito mais difícil do que atender pessoas, dizia, que se queixam e dão todos os pormenores sobre as maleitas que as afectam, tornando facílimo o diagnóstico. O médico ripostava que a humanidade não existiria sem humanos ...
Um dia, (há sempre um dia, até nas anedotas) o veterinário adoeceu e foi à consulta do seu amigo.
- Estou aqui para me consultares, mas não te vou dar qualquer pista sobre aquilo que sinto. Tens de conseguir descobrir o que tenho.
- Despe-te e deita-te nessa marquesa.
Auscultação, apalpação, espreitadela aos ouvidos, ao nariz e à garganta, exame à córnea, martelinho nos joelhos, um exame completo e minucioso.
- Não tem remédio. Abate-se!

Estou a ler O Alienista e outros contos, de Machado de Assis, um dos maiores da língua portuguesa, que nasceu no Rio de Janeiro em 1839 e por lá se finou em 1908. No conto "Um apólogo", Machado de Assis põe a agulha e a linha a polemizarem sobre uma ser mais importante do que a outra, e termina assim:

(...) Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava a um lado ou outro, arregaçava daqui e dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha, para mofar da agulha, perguntou-lhe:

- Ora, agora, diga-me quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá.

Parece que a agulha não disse nada: mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: - Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar a vida, enquanto tu aí ficas na caixinha da costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça: - Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária.
Machado de Assis
O Alienista e outros contos